Nossa Senhora Fashion

“Era uma senhora vestida de branco, com um colar brilhante e uma saia pelo joelho”

in Moisés Espírito Santo, Os Mouros Fatimidas e as Aparições de Fátima
(obra publicada pelo Instituto de Sociologia e Etnologia das Religiões, da Universidade Nova de Lisboa)

A sério que gostava de ser como os crentes. Não sabem nada, mas acreditam em tudo. Ou como os ateus. Não sabem nada, mas fingem que sabem tudo. Ou até como os agnósticos. Não sabem nada, não quererem saber e têm raiva de quem souber. Enquanto aguardo pacientemente que seja inventada uma qualquer sub-categoria em que se encaixe a minha ingénua pessoa, irei continuar a manter a veleidade de saber mais qualquer coisita. E é por causa de tão vincada teimosia que continuo a fazer perguntas, que parecem não interessar a crentes, ateus e agnósticos. Pelo menos ao grosso deles, havendo claro – tal como sucede em relação aos críticos de cinema – honrosas excepções.
É o caso de Moisés Espírito Santo, investigador maior da sociologia indígena, que, apesar do nome hebreu e do apelido epifânico, está-se bem nas tintas para existência ou não de qualquer divindade ou dimensão metafísica. Só que o homem não é burro. Nem dogmático. Nem tão pouco ingénuo – como eu. Leu de fio a pavio os testemunhos arquivados na Católica e verificou que os “videntes” descreveram, uma boa mão cheia de vezes, Nossa Senhora com uma saia travada pelo joelho. Ora tais declarações foram feitas logo após as primeiras aparições, durante a perseguição das autoridades republicanas, antecedendo a entrada em cena da Igreja para se apoderar do monopólio de Fátima e muito, muito antes das divertidas Memórias da Irmã Lúcia. Ora não consta que, em 1917, as tendências Primavera/Verão no Céu aconselhassem a hierarquia sobrenatural feminina a vestir saia pelo joelho. Ou que a subnutrida e analfabeta Lúcia tivesse uma veiazita de Salazar, a Ana não o Oliveira, antecipando uma moda que só desceria à Terra na década de 40 do século XX. Estranha-se e entranha-se o silêncio da Academia. Demasiado bizarro para ser estudado? Também a reprodução celular, a formação dos buracos negros ou o complexo de Édipo. Ou a existência do Universo. Então, se fosse assim, os cosmólogos e astrónomos já tinham dado um tiro nos cornos.
Com esta atitude, Galileu teria defecado alto e fininho no facto da Terra girar à volta do Sol e não o contrário. Claro que podemos sempre fazer como os crentes. E acreditar que a Terra gira em torno do Sol porque Deus quis. Ou como os ateus, que acreditam nas voltas que a Terra dá porque vem nos livros. Ou como os agnósticos, que estão-se a cagar para o facto da Terra andar à volta do quer que seja. Pronto, há excepções. E Moisés é uma delas. Graças ao Espírito Santo.